Casamento Judaico

Texto de Israel Blajberg:

1973. Já faz quase meio século que o jovem casal adentrou aquela verdadeira Catedral Judaica, imensa, com suas pinturas e vitrais resplandecentes. Uma chuvinha miúda abençoava os noivos na distante noite de sábado do Grande Templo Israelita. Um casamento já havia ocorrido, e mais outro ainda seria realizado. Três na mesma noite. Era preciso agendar um ano antes, para garantir a data. Hoje, talvez ainda ocorram três casamentos naquele tempo, mas por ano.

2019. Não foi possível retornar ao imponente Grande Templo, para comemorarem mais um aniversário de casamento. As cidades crescem feito amebas enlouquecidas, e já quase ninguém mais da comunidade judaica mora ali por perto, como nos tempos da Praça XI. A tradicional e histórica casa de orações em torno da qual desfilou a história judaica carioca passa quase todos os dias do ano fechada.
Há que escolher outra sinagoga para a comemoração, em uma noite de Shabbat. Nada de hotéis nem restaurantes, pois a vida do casal sempre girou em torno de sinagogas. Não que fossem ortodoxos, muito menos religiosos. Foi uma predestinação.
A primeira foi o Grande Templo Israelita, cujas visão das torres características á distancia ficou gravada indelevelmente na memória do marido, como se ainda estivesse no quintal do sobrado da saudosa avó Sara, na Rua do Senado, durante uma degustação gastronômica judaica ao ar livre dos pratos que ela sabia preparar tão bem.
Depois veio o Monte Sinai, onde os dois se conheceram, em um dia distante de 1969, o ano em que o homem pisou na Lua. Portanto, faz exatamente meio século que o menino de Quintino encontrou pela primeira vez a mocinha encantadora da Tijuca, durante um prosaico hi-fi à meia-luz, numa das casas que se erguiam onde hoje é a Sinagoga Beit Yehuda. Portanto, seu primeiro encontro foi em um solo sagrado…
Já casados, com a mudança para uma rua tranquila da Tijuca, passaram a morar ao lado de aconchegante e histórica sinagoga, uma antiga escola, onde residem até hoje, sempre participando do miniam, bastando chegar à janela, de onde se pode ouvir as rezas.
Portanto, é apenas natural que comemorem seu aniversário de casamento em ambiente sinagogal, que revive um pouco daquele mundo de onde vieram seus pais e avós, onde tudo parava no Shabbat, de gente piedosa e honrada, tementes ao Eterno, trilhando as ruas geladas do shtetale, e que um dia, tangidos pela intolerância, aqui aportaram plenos de esperança, legando aos filhos e netos suas ricas tradições, e um nome a zelar.
A reza termina, e todos se reúnem à mesa do salão de festas, diante do saboroso tchulent fumegante, que acabava de sair do fogão. A presença na sinagoga faz recordar especialmente as históricas reuniões ha tantos anos passados, de ilustres personalidades que daquele palco declamavam seus discursos em yiddish, alguns eram deputados da Knesset, tradição revivida com a fantástica visita do primkeiro-ministro Natanyahu.
Vem à mente também aquela aventura na porta da sinagoga. Era o final do ano de 1959. Uma onda de pichações antissemitas varreu a Europa no Natal daquele ano, decorridos apenas 14 anos do Holocausto. A comunidade judaica do Rio resolveu se precaver, e grupos de jovens passavam as noites diante dos clubes, escolas e sinagogas. Com apenas 14 anos, o menino passou suas primeiras noites fora de casa, ali na rua, com o pessoal do Betar. Ainda não existiam muitos prédios em volta, apenas terrenos vazios, muitas casas. No fim tudo acabou bem, nenhuma instituição foi pichada, e o Presidente Juscelino fez uma visita de solidariedade aos sobreviventes da Shoá que residiam no Lar União do Rio Comprido.
Assim segue a vida, feita de pequenas doses de felicidade, como poder comemorar junto a família, em união e alegria. Que a bondade do Eterno continue brilhando sobre suas vidas, com muitas brachot, tefilot, saúde, sucesso, mitzvot e que Maschiach possa chegar em boa hora, Amem ve Amem. Que só tenhamos notícias boas para comemorar, sempre ao lado dos filhos, netos, amigos, com muita luz e que Haschem continue iluminando sempre o caminho de todos, Bezrat Haschem possamos estar todos sempre reunidos, Amém vê Amem.
Shabat Shalom uMevorach